Passeio de outro mundo
Tarde fria em Manteigas, gelada mesmo, enquanto trabalho no portátil, aquecido pelo forno de uma padaria, vou vendo, lá fora, os flocos de neve a cair na rua, a vontade de ir para o ar livre começa a fervilhar.
Regresso a casa, gelado, para almoçar, a vontade não passa apesar do frio. A parte pior é mesmo despir para vestir o equipamento.
Preparo tudo o que tenho à mão, luvas, luvas extra, golas, gorros, cachecóis, meias e vários casacos, até uso um inédito blusão tipo kispo. Meto tudo numa mochila e faço-me à estrada.
Subo, subo e rapidamente atinjo os primeiros patamares com neve acumulada. Vou contemplando os socalcos nevados e sentindo a paz de um outro mundo, de uma montanha mágica e tranquila.
Rumo em direção às Penhas Douradas, vou sendo incentivado pelos turistas, que ao volante do seu automóvel se aventura por aquelas agrestes paragens. Alguns até me fotografam, abrindo a janela para falar um pouco comigo.
Os melhores momentos são os de solidão, contemplando as paisagens geladas, sentindo a neve no rosto, vendo a neve a desprender-se dos pinheiros e a ser espalhada pelo vento. Ouve-se apenas o ranger do gelo sob os pneus, a água a correr nas fontes e em pequenos ribeiros, despenhando-se serra abaixo, um ou outro pássaro, deslocado naquele universo gelado. Momentos mágicos e inéditos, do melhor em cima da bicicleta.
Lá em cima as condições agravam-se e a neve, levada por vento forte, ia-se assenhorando da estrada. Era hora de vestir tudo o que havia a vestir e fazer uma cautelosa descida, com a bicicleta carregada de neve nos travões e transmissão, para encerrar uma tarde memorável no pedal.
A bike, companheira de várias aventuras trouxe-me até ao destino, mas hoje quando queria repetir a aventura, agora com sol, a corrente cedeu e recusou-se a continuar.